
Vanzolini ganha homenagem aos 85
FOLHA - O senhor fazia a ronda em São Paulo quando compôs "Ronda". O senhor era cabo da polícia...
PAULO VANZOLINI - Polícia, não. Da polícia foi o Nelson Cavaquinho. Eu era da cavalaria, que era a polícia do Exército. Mas a patrulha era a pé. A gente patrulhava a pé o baixo meretrício, o Bom Retiro, o centro, a região da São João.
FOLHA - E se inspirou assim?
VANZOLINI - Cansei de ver mulher chegar na frente do bar, olhar para dentro como se procurasse alguém e ir embora. Não foi uma só que vi. Escrevi sobre isso.(Saiba mais aqui)
FOLHA - E quanto a "Volta por Cima"? Qual é a história por trás da composição?
VANZOLINI - Não tem. Fiz porque fiz. Tem até uma história de que fiz porque perdi um filho num acidente. Mas, na verdade, fiz a música antes.
FOLHA - O senhor ainda compõe?
VANZOLINI - Larguei. Fazia música por prazer. Perdi o gosto. Eu estava em Mato Grosso, na década de 80, e fiz a última, "Quando Eu For, Eu Vou Sem Pena". É muita mão de obra. Ficava seis meses para resolver uma rima...
FOLHA - E o que o senhor está fazendo atualmente?
VANZOLINI - Difícil explicar. Fiz recentemente um trabalho sobre cascavéis e alguma coisa em cima de relatórios de impactos ambientais.
FOLHA - O senhor ganhou dinheiro com música?
VANZOLINI - Dinheiro, só ganhei com "Volta por Cima". Foi a única. Não sei por quê, deu uma enxurrada de dinheiro. Foi em 1959, 1960. Comprava livro sem ver o preço. Sempre coloquei tudo o que ganhei na biblioteca que tinha na minha sala do museu. Agora doei tudo para o museu.
FOLHA - Por que quis ser zoólogo?
VANZOLINI - Pelos répteis. Fui ao Butantan menino e gostei muito dos répteis.
FOLHA - Quais répteis?
VANZOLINI - Répteis só existem quatro: tartaruga, jacaré, lagarto e cobra.
FOLHA - Nunca trabalhou com sapos e rãs?
VANZOLINI - Sapo, não, graças a Deus.
FOLHA - Seu maior orgulho é musical ou científico?
VANZOLINI - Não tenho orgulho. Tenho satisfação. Trabalhei em todos os Estados do Brasil. Tive um barco no Amazonas.
FOLHA - Qual é a maior satisfação?
VANZOLINI - É a teoria dos refúgios. Sobre ciclos de vegetação no Amazonas. O clima fica mais seco, depois mais úmido, e acaba criando "ilhas" de vegetação sem contato umas com as outras. O lagarto fica ali e vai se diferenciando. Quando o clima permite que as ilhas se juntem de novo, os lagartos já não conseguem procriar. Já são espécies diferentes.
FOLHA - Que lagarto foi esse que o senhor estudou?
VANZOLINI - O lagarto anolis. Mas fui o segundo. Um alemão, estudando pássaros, publicou três meses antes os mesmos resultados. Estava escrevendo o meu artigo quando chegou a revista "Science" com o dele.
FOLHA - Que tragédia!
VANZOLINI - Mas o meu é original. Não usei o dele. Tenho enorme satisfação por esse trabalho. Fiz em conjunto com Ernest Williams, cientista americano. E continuei trabalhando até 2004, quando saí do museu.
Tive quatro úlceras hemorrágicas e três infartos na mesma noite. Ouvi os enfermeiros falando: "O velhinho não passa dessa noite". Fiquei com 30% da capacidade do coração.
FOLHA - E o que senhor acha dessas homenagens nesta semana?
VANZOLINI - Não gosto de homenagem. Mas gosto de show. Pego minha cervejinha e sento na mesa ali na frente. Adoro.
VANZOLINI - Com. Isso os médicos ainda não tiraram.
Quem se interessou, deve conferir a agenda da Semana Vanzolini. Já hoje tem a pré-estreia do filme "Um Homem de Moral" no Espaço Unibanco. Saiba mais aqui.
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