terça-feira, 25 de dezembro de 2007

Wilson Batista: De malandro a operário

Mais conhecido pela polêmica em que se envolveu com Noel Rosa, Wilson Batista não tinha muita instrução e mal sabia assinar seu nome. Mas isso nao o impediu de gravar seu nome na galeria dos grandes compositores de samba. Começou a carreira nos cabarés da velha Lapa. Além disso ainda trabalhava como eletricista e ajudante de contra-regra no Teatro Recreio, na Praça Tiradentes.

Wilson era amante da boemia, apoiava a malandragem e era um malandro de fato: para ganhar algum dinheiro ia desde a cafetinagem até a venda de sambas. O sucesso veio em 1933 com um samba chamado "Desacato" em parceria com Patrício Vieira e gravado por Francisco Alves, Castro Barbosa e Murilo Caldas. No mesmo ano o samba "Lenço no pescoço" foi gravado por Sílvio Caldas, samba que daria início a famosa polêmica já mencionada, dizendo:

Meu chapéu do lado
Tamanco arrastando
Lenço no pescoço
Navalha no bolso
Eu passo gingando
Provoco e desafio
Eu tenho orgulho
Em ser tão vadio
Sei que eles falam
Deste meu proceder
Eu vejo quem trabalha
Andar no miserê
Eu sou vadio
Porque tive inclinação
Eu me lembro, era criança
Tirava samba-canção
Comigo não
Eu quero ver quem tem razão
E eles tocam
E você canta
E eu não dou

Mas seu primeiro grande sucesso veio na voz de Moreira da Silva, com o samba "Acertei no milhar" (1938), composto em parceria com Geraldo Pereira.

Em meados dos anos 1940, Wilson teve que mudar a temática dos seus sambas, que exaltava a malandragem, principalmente por conta de uma portaria do governo da época que proibia tal coisa. O samba que marca esta reviravolta em sua obra foi composto junto com Ataulfo Alves e chama-se "O bonde de São Januário", que diz:

Quem trabalha
É quem tem razão
Eu digo
E não tenho medo
De errar

Quem trabalha...

O Bonde São Januário
Leva mais um operário
Sou eu
Que vou trabalhar

O Bonde São Januário...

Antigamente
Eu não tinha juízo
Mas hoje
Eu penso melhor
No futuro
Graças a Deus
Sou feliz
Vivo muito bem
A boemia
Não dá camisa
A ninguém
Passe bem!


Wilson Batista morreu na miséria, por conta do abuso das drogas, do álcool e da depressão causada pelo esquecimento de seu nome.


Ouça Wilson Batista:
Desacato
Por favor vai embora
Inimigo do batente
O bonde de São Januário
Acertei no milhar
Louco (Ela é o seu mundo)
Mundo de zinco
Nega Luzia
Ganha-se pouco mas é divertido
Lenço no pescoço
Oh! Seu Oscar
E o 56 não veio

quinta-feira, 20 de dezembro de 2007

Paralelas do ritmo

Retirado do site algo a dizer.

Por Áurea Alves

Costuma-se brincar quando um grupo de pessoas canta de modo desafinado, chamando-os de “paralelos do ritmo” aqueles que nunca se encontram. Paralelas diz-se das retas que não se encontrarão em ponto algum do plano geométrico.
Paralelos são os trabalhos de Maria Rita e Teresa Cristina, recém-lançados, dedicados ao samba e que possuem características distintas desde a concepção até o acabamento das capas dos discos. Não se trata de reduzir o universo de cantoras de samba aos dois nomes, mas comparar dois trabalhos que anunciam jamais se encontrar. O samba de Maria Rita é de oportunidade, serve-lhe para ajustar o destino de sua carreira, mantê-la em evidência, com um trabalho que pode repercutir em vendagem e em casas lotadas durante seus shows. O de Teresa segue por outro caminho, apresentando-a como compositora que mergulha cada vez mais no universo do samba e, em especial neste disco, realça suas características de cantora. Teresa se consolidará como representante do movimento de samba surgido na Lapa (Rio de Janeiro). Maria Rita ainda precisará buscar sua identidade dentro da Música Popular Brasileira, mesmo que prossiga com altas vendagens.

O samba de resultados de Maria Rita
Maria Rita nasceu em família de artistas: o pai, o arranjador e pianista César Camargo Mariano e a mãe, a perfeita e insuperável, Elis Regina. Sua voz se assemelha à da mãe Tornou-se cantora, quase como decorrência natural de sua família – seu irmão Pedro é cantor e seu meio irmão, João (filho de Elis e Ronaldo Bôscoli) está à frente da gravadora Trama, que se especializou em artistas dessa geração, com trabalhos voltados ao mundo pop.
Seu primeiro disco foi recebido com críticas, em primeiro lugar pelo uso explícito da semelhança com Elis, até na elaboração do repertório que lembrava o da falecida cantora – com direito a música de Milton Nascimento. Em segundo lugar porque de fato o disco era irregular e as músicas selecionadas não definiam o propósito artístico de Maria Rita. Seu segundo disco seguiu na mesma linha, buscando a dissociação, mantendo um repertório irregular.
Apesar do investimento em marketing, Maria Rita não ocupou espaço entre o grupo de artistas que mais vendem discos e trafegou titubeante num espaço em que já reinavam Ivete Sangalo e seu axé pop, Ana Carolina e suas canções modernas voltadas para o público feminino e Marisa Monte com suas baladas tribalistas e seu samba autoral, dentre tantas outras cantoras, campeãs de venda. Ficou no que se pode chamar de linha média, vendendo bem, sem imprimir uma marca especial para si.
Com o lançamento do CD Samba Meu, opta por enveredar-se pelo mundo do samba, considerando o momento em que vive o gênero, uma experiência como admite, sem buscar tornar-se especialista no gênero. Para isso juntou-se ao produtor Leandro Sapucahy (ex-pagodeiro, percursionista do grupo de Marcelo D2) que lhe conduziu, segundo afirma, pelo mundo do samba.
O resultado foi um disco bem produzido em que Maria Rita interpreta seis sambas de Arlindo Cruz, partideiro do Cacique de Ramos, de Gonzaguinha, Serginho Meriti (com o ótimo Cria), alternando arranjos típicos de roda de samba, com outros com levada de bossa-nova. Como normalmente ocorre em seus discos, a produção é bem cuidada, com bons arranjos, não necessariamente criativos, mas que provocam uma outra percepção de sambas que funcionam bem nas rodas do subúrbio. São sambas que ganham uma interpretação adequada confirmando a qualidade vocal desta cantora.
Contudo, o que não cai bem é a verdadeira identidade de Maria Rita com o samba. A impressão deixada, em que pese a qualidade, frise-se, é de que se trata de um trabalho artificial, levando à constatação de que a cantora ainda não encontrou seu verdadeiro espaço na Música Popular Brasileira, e opta pelo samba como alternativa vendável, buscando para isso assessorias confiáveis e do ramo – no caso, de Ramos. Sinal de que pode cair no grupo de boas cantoras que não dominam a escolha de seu repertório e oscilam entre estilos, correndo o risco de desgastar a carreira.
Essa sensação confirma-se pela capa escolhida, que remete à religiosidade dos sambistas, às suas roupas e aos trejeitos. Maria Rita usa um chapéu de palha e traz um grosso cordão dourado sustenta figas de cristal e um medalhão. Signos que reunidos remetem ao universo dos subúrbios cariocas, talvez. No entanto despem-se da significação que de fato poderiam conter, como é este disco. Na contra-capa imagens de santos, São Jorge ao centro, num arranjo que lembra um altar ou uma oferenda. Assim Samba Meu encerra os trabalhos.

Ficha técnica:
Samba MeuProdução:Leandro Sapucahy
Co-produção: Maria Rita
Warner Music
1. Samba Meu (Rodrigo Bittencourt)
2. O Homem Falou (Gonzaguinha)
3. Maltratar Não É Direito (Arlindo Cruz e Franco)
4. Num Corpo Só (Arlindo Cruz e Luis Cláudio Picolé)
5. Cria (Serginho Merity e César Belieny)
6. Tá Perdoado (Arlindo Cruz e Franco)
7. Pra Declarar Minha Saudade (Arlindo Cruz e Jr. Dom)
8. O Que É o Amor (Arlindo Cruz, Fred Camacho e Maurição)
9. Trajetória (Serginho Merity, Arlindo Cruz e Franco)
10. Mente ao Meu Coração (Francisco Malfitano e Pandia Pires)
11. Novo Amor (Edu Krieger)
12. Maria do Socorro (Edu Krieger)
13. Corpitcho (Ronaldo Barcelose Luis Cláudio Picolé)
14. Casa de Noca (Serginho Merity, Nei Jota Carlos e Elson do Pagode)

O delicado samba de Teresa Cristina
Teresa Cristina nasceu no subúrbio carioca, foi manicure, estudou letras, freqüenta umbanda e decidiu ser cantora já formada em Letras. Sua carreira começou praticamente na num período anterior à revitalização do bairro, quando algumas poucas casas abrigavam alguns sambistas em rodas, à revelia das condições do bairro.Tanto quanto o bairro passou a ser revitalizado, cresceu a importância da cantora, acompanhada pelo Grupo Semente, composto por Bernardo Dantas, Pedro Miranda, João Callado e Trambique. A formação dos músicos determinou o interesse pelo samba, especialmente aquele produzido na Portela, como se percebe na influência de Candeia e na construção do repertório dos discos que se seguiram.
Ao trabalho dessa cantora e compositora não se aplica o termo resgate, uma vez que sua principal característica é o diálogo com o samba produzido fora da Lapa, em especial em Oswaldo Cruz. São exemplos disso, as composições feitas em parceira com Argemiro do Patrocínio (falecido integrante da Velha Guarda da Portela) e a presença da cantora na ala dos compositores da escola de samba Portela.
Teresa produz samba como se constata no CD Delicada, em que apresenta composições próprias, em parcerias com João Callado e com Zé Renato. Assim, nesse repertório, identifica-se a influência de compositores portelenses como os sofisticados Paulinho da Viola, Zé Ketti e Candeia.
Um aspecto importante neste disco é que a cantora abandona a timidez, afirmando-se como cantora, imprimindo características próprias ao interpretar Gema (Caetano Veloso), Carrinho de Linha (do esquecido sambista baiano Walter Queiroz) e em No pé do lageiro (de João do Valle), além da faixa-título, que interpreta com mais sentimento do que delicadeza, secundada pelos arranjos do grupo com participação de Paulão Sete Cordas em A paz do Coração (Candeia).
É um disco produzido para o mercado, e como todo o resto, do qual se espera uma boa vendagem, uma vez que é o primeiro dessa cantora em uma grande gravadora, registrando a produção e o tratamento dado ao samba pelos novos grupos surgidos na Lapa. É o trabalho que Teresa Cristina sempre fez e continuará a fazer, delicadamente.

Ficha técnica:
Delicada Produção: Paulão 7 Cordas
EMI
1. Cantar (Teresa Cristina)
2. A Gente Esquece (Paulinho da Viola)
3. Fim de Romance (Teresa Crisitna e Argemiro)
4. Nem Ouro, Nem Prata (Ruy Maurity)
5. Quebranto (Alfredo del Penho e Teresa Crisitna)
6. Gema (Caetano Veloso)
7. Carrinho de Linha (Walter Queiroz)
8. Pé do Lageiro (João do Valle)
9. Senhora das Águas (João Callado e Teresa Crisitna)
10. João Teimoso (João Callado)
11. Delicada (Teresa Crisitna e Zé Renato)
12. A Paz no Coração (Candeia e Cabana)
13. Saudade de Você (Teresa Cristina e João Callado)
14. Fechei a Porta (Sebastião Motta/Delice Ferreira)/Rosa Maria (Anibal da Silva/Éden Silva)/Jura (Adolfo Macedo/Marcelino Ramos)

Áurea Alves é jornalista

domingo, 16 de dezembro de 2007

Obrigado, Terreiro Grande!

Hoje em dia, graças à Internet, é possível ter um pouco mais de noção de alguns acontecimentos. Estou me referindo (mais uma vez) ao grupo Terreiro Grande, que recentemente esteve no Rio de Janeiro para divulgar o disco que lançou junto com Cristina Buarque. Segundo relatos de cariocas que acompanharam o grupo, não só no show que ocorreu no Trapiche Gamboa, mas como também na roda que foi realizada na Ilha de Paquetá, o grupo foi só elogios. E deixando o bairrismo de lado, confirmaram a qualidade do grupo que os paulistas já conheciam.

Por onde passam, eles resagatam aquela alegria e leveza que a muito tempo a gente não encontrava no samba. Até agora a única menção negativa que encontrei ao trabalho deles foi em uma coluna do Nelson Motta, aonde ele diz, sem citar qualquer grupo, que os novos artistas que estão gravando samba como por exemplo a Maria Rita e o D2 inovam e "[...]deixam os resgates para o Corpo de Bombeiros[...]" referindo-se às gravações atuais de sambas antigos.

A verdade é que pela primeira vez me sinto vivendo uma revolução artística, dessas que a gente só ve na escola, provocada pelo "estouro" do grupo Terreiro Grande. Fico cheio de esperança só de pensar que este pode ser o primeiro passo de uma retomada mais abrangente dos sambas e dos sambistas esquecidos, ou não. E tenho quase certeza que, bons frutos virão com o tempo. Se Deus quiser!!!

Ingrata Solidão --- Geraldo Babão


TERREIRO GRANDE OU UMA REUNIÃO DE AMIGOS

quarta-feira, 12 de dezembro de 2007

100 anos de Cartola sem Cartola

"Mangueira, a tua imponência te fez grande escola
Teu poeta maior foi o mestre Cartola
Te deu formas e cores e te projetou"
(Nelson Sargento)

2008 é um ano especial para a Mangueira e para o samba como um todo. É o centenário do Mestre Cartola. Nada mais natural que Cartola voltasse à avenida 28 anos depois de sua morte como o enredo da verde e rosa, mas a praga dos enredos patrocinados já tomou conta do carnaval carioca e já começa a se instaurar no carnaval paulista, e por isso o enredo será: 100 anos do frevo. É de perder o sapato. Recife mandou me chamar.

Não é querendo desmerecer o frevo, mas são 100 anos de frevo e 100 de Cartola, que foi um dos fundadores da escola, que deu o nome de Estação Primeira de Mangueira, que escolheu as cores e que fez uma infinidade de sambas que o consagraram como um dos maiores poetas do morro de Mangueira.

Em 2002 a mesma gafe foi cometida, era centenário de Carlos Cachaça. Essa é mais uma consequência da deturpação das escolas de samba.

Mangueira, Divina e Maravilhosa --- Nelson Sargento

sexta-feira, 7 de dezembro de 2007

Vermute com Amendoim recomenda: Paulo Vanzolini --- Por ele mesmo

Paulo Vanzolini seguiu caminhos diferentes da maioria dos sambistas ao qual estamos acostumados. Nasceu em São Paulo no ano de 1924, cursou o primário no tradicional colégio da capital paulista Rio Branco. Em 1942 ingressou na Faculdade de Medicina onde começou a compor seus primeiros sambas e a freqüentar suas primeiras rodas que eram promovidas pelos próprios estudantes.

Vanzolini se formou em medicina no ano de 1947, e no ano seguinte logo após se casar foi para os EUA onde ganhou o título de Doutor em zoologia que lhe foi conferído pela tradicionalíssima Universidade de Harvard e, por conta disso, foi lecionar zoologia na USP. Entre seus sambas mais conhecidos estão: Ronda, Cravo Branco e Volta por Cima.




















1 - Bandeira de guerra
(Paulo Vanzolini)

2 - Tempo e espaço
(Paulo Vanzolini)

3 - Raiz
(Paulo Vanzolini)

4 - Samba erudito
(Paulo Vanzolini)

5 -Amor de trapo e farrapo
(Paulo Vanzolini)

6 - Alberto
(Paulo Vanzolini)

7 - Falta de mim
(Paulo Vanzolini)

8 - O rato roeu a roupa do rei de Roma
(Paulo Vanzolini)

9 - Cravo branco
(Paulo Vanzolini)

10 - Vida é a tua
(Paulo Vanzolini)

11 - Capoeira do Arnaldo
(Paulo Vanzolini)

12 - Samba do suicídio
(Paulo Vanzolini)

13 - Samba abstrato
(Paulo Vanzolini)

Paulo Vanzolini --- Por ele mesmo (1979)

segunda-feira, 3 de dezembro de 2007

Lamento do Samba

Em homenagem ao dia nacional do samba, que foi ontem:

O LAMENTO DO SAMBA
(Paulo César Pinheiro)

Eu tenho saudade
Dos sambas de antigamente
Quando o samba deixava
Uma vaga tristeza
No peito da gente
Não era amargura
E nem desventura
E nem sofrimento
Era uma nostalgia
Era melancolia
Era um bom sentimento.
Nos dias de hoje
O samba ficou diferente
Não tem mais dolência
Mudou a cadência
E o povo nem sente
Sua melodia
É uma falsa alegria
Que passa com o vento
Ninguém percebeu
Mas o samba perdeu
Sua voz de lamento.
Quando eu canto na roda de samba
Um samba que é mais antigo
A moçada se cala, escuta, aprende,
E ainda canta comigo
O que falta pra quem faz um samba
É a tristeza que vem de outro tempo.
Quem não sabe a ciência do samba
Vai fazer o que pede o momento.
O segredo da força do samba
É a vivência do seu fundamento.
O que faz ser eterno um bom samba
É a beleza que tem seu lamento.


Parabéns a todos os sambistas e admiradores.

O lamento do Samba --- Paulo César Pinheiro (2003)
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