segunda-feira, 4 de maio de 2009

Disco da semana: Versátil - Nelson Sargento

O Vermute com Amendoim segue em marcha lenta. Isso porque, mais uma vez estamos sem internet, e o pior é que agora sabe se lá quando voltará. Mas mesmo assim seguiremos postando na medida do possível.
O disco desta semana é o último de Nelson Sargento, lançado no ano passado. Foi intitulado "Versátil", pois há a inclusão de uma valsa, um fox-trot e um bolero. Mas não deixa de lado os tradicionais sambas, dos quais vale destacar "Nas asas da canção", uma bela parceria de Dona Ivone Lara e Nelson Sargento. Aliás, Dona Ivone faz uma participação simples, porém genial, cantando o seu tradicional "lalaraiá". "Verão no rosto", é outro grande samba que merece ser grifado de Nelson Sargento. Desta vez a parceria é assinada por Maurício Tapajós.

Também destaco a valsa "Rosa Maria, flor mulher", que é solada por Wagner Tiso, parceiro de Nelson na música. E finalmente também chamo a atenção para o samba enredo "Século do samba", feito para o caranaval de 1999 (caramba já fazem 10 anos!), mas que não foi para a avenida.

P.S.: O disco tem patrocínio da Natura.

Veja o que escreveu Nei Lopes no encarte do disco "Versátil":

Nelson Sargento – Versátil sem perder a Raiz

Afinal pra quê serve um “sambista de raiz”?

Esta pergunta nós nos fizemos, num misto de tristeza e indignação, quando vimos o parceiro Wilson Moreira cair vítima de um derrame, cerca de onze anos atrás.

Naquele momento, a garotada, filha daquela rapaziada universitária que se extasiou com a modernidade afro de Clementina no Teatro Jovem e elevou o velho Zicartola à categoria de templo maior do samba carioca, começava a descobrir os finos petiscos de Cartola, Candeia e companhia. E, aí, nós, aporrinhados da vida, chamamos para nós mesmos a responsabilidade da resposta.

No nosso modesto entender – pensamos –, um sambista de verdade (“de raiz” é rótulo maroto) serve como ponte entre o ontem e o amanhã; como referencial e também como baluarte – no sentido de “suporte, apoio, sustentáculo” e também no de “fortaleza inexpugnável” contra as investidas destruidoras.

Agora – perguntávamos novamente, para logo depois voltarmos a responder – : quanto vale um sambista, nessa história?

Em termos de mercado, sabemos, por experiência própria, que vale muito pouco. Porque os assim chamados, principalmente os rotulados como “de raiz”, são sempre aqueles que, embora reverenciados e com boa entrada na tal da “mídia”, quase nunca são gravados pelos grandes vendedores de disco; quase sempre são convidados “especiais” só para cantar de graça ou receber o “simbólico”, o “da passagem”; e nunca, apesar das placas-de-prata e medalhas de mérito, são incluídos no contexto da milionária indústria cultural.

Mas acontece que, hoje, graças aos deuses e musas, o que de melhor se faz na música popular brasileira, incontestavelmente, está exatamente fora desse contexto aviltado e emburrecido. E este é, com toda a certeza, o caso de Nelson Sargento e deste seu CD “Versátil”.

Às vésperas de completar 84 anos de idade; 43 anos depois do inesquecível Rosa de Ouro; numa trajetória artística e literária que inclui telas, filmes e livros, Sargento põe a tropa em fila e apresenta suas armas, neste seu quinto CD individual. E essas armas são: composições com sua marca, parcerias geniais, arranjos eficientes, músicos de grande talento... E fidelidade absoluta à sua sina de artista moderno e corajoso.

O disco começa com um autêntico ivone-lara (substantivo incomum), pra malandro nenhum botar defeito. Pois "Nas asas da canção", embora Nelson sempre apareça, no “ocaso da vida”, na “mente cansada”, “emoldurando a fantasia”, é um ivone-lara legítimo, safra 1947. E dele vamos para o correto "Sinfonia imortal", parceria com Agenor de Oliveira, conhecido como intérprete e entusiasta da obra de Noel Rosa (o saudoso poeta da Vila), de ausência quase tão sentida, para nós, quanto a do nosso pranteado parceiro Maurício Tapajós, que assina, com Sargento, o "Verão no Rosto". Nessa faixa, a seqüência harmônica do trecho “sorriso infantil” parece Maurício dizendo “estou aqui!”. E daí, passamos, tirando o chapéu, por um Cartola ("Ciúme doentio"), para chegar à primeira surpresa do disco.

Mas como?! Uma valsa? Sem letra? E solada ao piano pelo Wagner Tiso?

Calma, prezado leitor-ouvinte! "Rosa Maria, flor mulher" é apenas a primeira surpresa deste CD “Versátil”. Porque, a faixa seguinte, "Bálsamo"... é um bolero! Com direito a acordeom e tudo! No melhor estilo anos 50. E a outra é um fox ("Primeiro de abril"), com a guitarra elétrica harmonizando, tipo Oscar Moore ou Billy Mackel; e na qual nosso Sargento incorpora Custódio Mesquita na melodia e Lamartine Babo na letra lírico-brincalhona.

Mas a versatilidade do artista é claro que acaba (ou continua) em samba. Com o protesto partideiro do parceiro Agenor em "Acabou meu sossego"; com outra reclamação, desta vez mais bronqueada, quando o letrista acusa a mentirosa de “tapar o sol brilhante com a peneira da ilusão” ("Parceiro da ilusão"); até que chegamos ao “samba do Marreta”.

Compositor dos primeiros tempos da verde-e-rosa, Marreta, integrante da Galeria de Honra da ala de compositores mangueirenses, ao que consta, jamais ganhou um samba-enredo e é muito pouco conhecido. E é Nelson Sargento que, agora, o apresenta ao grande público, nesta parceria ("Só eu sei") tão pequenininha quanto melodiosa e contagiante. Um verdadeiro samba-de-terreiro dos bons tempos! Tão forte quanto a faixa seguinte, "Pobre milionária", é ilustrativa da influência de Cartola nas obra do nosso grande artista.

Sobre o clássico "Falso amor sincero" já se disse tudo. Mas aí vêm, de novo, Sargento e o Oliveira com uma marcha-rancho “daquelas” – que não nega sua raça nem no arranjo. Versatilidade! E, então, o excelente "Pranto ardente", nos faz ver Os Cinco Crioulos (inclusive com os saudosos Anescar e Jair) metendo bronca, de terno branco, no palco do Teatro Jovem; e nós também. Mas eis que chega o "Século do samba", concorrente ao enredo da Manga em 1999, nos fazendo coçar a cabeça: “é melhor este samba aqui, Seu Nelson; pois lá, ia virar outra coisa!”. É nessa que a letra de Ídolos e astros dá o recado final: “Os grandes artistas, como Nelson Sargento, sempre viverão na memória daqueles que têm respeito e consideração”.

Pois é isto! Ponte entre o ontem e o amanhã, este CD mostra, de fato, a maestria e a versatilidade de Nelson Sargento, valioso e valoroso, referencial e baluarte. Fortaleza inexpugnável do samba, ao lado de Evonete (seu “bálsamo”), ele incursiona também por outras “praias” do seu tempo. E, assim, sob a batuta desse extraordinário Paulão Sete Cordas e contando com um batalhão de grandes músicos e amigos, ele, versátil sem perder a raiz, põe a tropa na rua e toma suas providências.

É para isto que serve um sambista de verdade!

Músicas:
1. Nas Asas da Canção (Dona Ivone Lara / Nelson Sargento) - com Dona Ivone Lara
2. Sinfonia Imortal (Nelson Sargento / Agenor de Oliveira)
3. Verão no Rosto (Maurício Tapajós / Nelson Sargento)
4. Ciúme Doentio (Cartola / Nelson Sargento) - com Zeca Pagodinho
5. Rosa Maria, Flor Mulher (Nelson Sargento / Wagner Tiso) - com Wagner Tiso
6. Bálsamo (Nelson Sargento)
7. Primeiro de Abril (Nelson Sargento)
8. Acabou Meu Sossego (Nelson Sargento / Agenor de Oliveira)
9. Parceiro da Ilusão (Nelson Sargento / Agenor de Oliveira)
10. Só Eu Sei (Nelson Sargento / Marreta)
11. Pobre Milionária (Nelson Sargento)
12. Falso Amor Sincero (Nelson Sargento)
13. Amar Sem Ser Amado (Nelson Sargento / Agenor de Oliveira)
14. Pranto Ardente (Nelson Sargento / Oscar Bigode)
15. Século do Samba (Nelson Sargento / Josimar Monteiro / Francisco Blanco) - com Velha Guarda da Mangueira
16. Ídolos e Astros (Marinho Da Chuva / Nelson Sargento)

Disco indisponível para download. Compre esse disco aqui.

Nenhum comentário:

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...