sexta-feira, 12 de dezembro de 2008

Uns brindes ao Bip!

O Murilo apresentou uma noca seção ontem, Na Estante. Hoje vou usar um livro pra falar de outro que será lançado.

"Bip Bip 40 anos" reúne textos de anônimos e famosos sobre o ilustre bar no bairro de Copacabana, timoneado por Alfredo, o conhecido Alfredinho. Sua inauguração foi exatamente no mesmo dia em que foi decretado o Ato Institucional n° 5. O lançamento, é claro, terá como pano de fundo uma roda de samba, já tradicional no botequim. A festa começará às 18 horas e tomará conta da Rua Almirante Gonçalves, em Copacabana.


De aperitivo, vai um texto de Moacyr Luz sobre o boteco. Foi publicado no primoroso livro Botequim de Bêbado Tem Dono, do Moacyr e belissimamente ilustrado por Chico Caruso:

"Na minha tabuada pessoal, botequim tem que ter, no mínimo, um pote de tremoços, bandeja de jilós e, vez por outra, sardinha frita em óleo saturado. É verdade que depois me arrependo de joelhos em frente a um copo d´água benzido de alka-seltzer. O Bip-Bip não tem nada disso, acho até que existe um vidro com duas conservadíssimas azeitonas, mas o que interessa no bar é a música, ela é o alimento dos bebuns. E o comandante de tudo é o Alfredinho. Botafoguense doente e medalhado com a Ordem Pedro Ernesto, permanece polivalente na função de proprietário, gerente, funcionário e segurança do estabelecimento. Sem a pretensão de biógrafo, exponho mais esse craque. Não suporta perfume. Fuma sem cerimônia até dentro do Hospital do Câncer. Acha um absurdo aplausos em roda de choro. Como demonstração de contentamento para com os músicos, inventou em tais eventos pequenos estalos entre os dedos. Exige silêncio até em ensaio de escola de samba e, mesmo sendo ali seu único ganha-pão, detesta servir e cobrar.

Pra fechar: foi o primeiro sujeito a vender nossos discos de samba, abrindo mão no seu minúsculo bar da necessária despensa pra encaixar os CDs alternativos. No seu aniversário, a feijoada é pretexto pra angariar fundos para entidades filantrópicas. Acho que ele é o mentor da ONG Se Essa Rua Fosse Minha e afirmo que, se o samba invadiu de novo a cidade, a retomada nasceu nas mesinhas do estabelecimento. E salve Cristina Buarque!

Acontece que o assunto é bar
O lugar é famoso e, vez por outra, surgem ônibus de excursão para visitá-lo, na ilusão de que ali o espaço seja maior do que o da antiga Plataforma. Nossa história real começa com um casal de outro estado, máquina fotográfica em punho, querendo muito passar a tarde no templo da boemia carioca. Era sábado, e Alfredinho, de bermuda como sempre, estava sentado à mesa de fora, uma perna dobrada, as costas arqueadas e o Trim na mão. Sabem o que é Trim? Um antigo cortador de unha que, invertida a haste, é capaz de cortar até casco de cavalo:
- É aqui o bar Bip-Bip?
- Leu a placa?
- Ah, sim, é verdade. O senhor poderia servir dois chopes?
- Aqui não se trabalha com chope, só cerveja.
- Desculpe-me, então uma cerveja, por favor.
- Olha, a cerveja aqui é pequena. Pra vocês é melhor pedir duas.
- Sim, sim, claro! Duas cervejas!
- Meu amigo, nós aqui não temos garçom. Vai lá dentro, abre o freezer, pega as bebidas e, depois, na prancheta do lado, você anota o seu nome e faz uns risquinhos com a quantidade.
Catatônico, o turista segue em direção à geladira e ainda ouve a última frase do nosso anfitrião:
- Aproveita e mata essa baratinha que está passando aí!

Baixa o pano. O lugar tem história da música nas suas paredes. Os quadros testemunham os belos encontros que o Alfredinho já proporcionou à cidade do Rio de Janeiro, como a recepção a Dona Ivone Lara, todo um silêncio como arranjo às melodias de Elton Medeiros e uma dinastina de mestres do enredo: Walter Alfaiate, Nelson Sargento e Paulão Sete Cordas. Como livro é sobre bar, e não de centro cultural, dou a minha dica: o Bip-Bip tem uma das melhores batidas de maracujá da região. Servida em copo grande, vem quase no volume da caipirinha e, pra quem gosta de ficar bêbado, bastam duas doses. Eu gosto."

Ah, estivesse eu no Rio de Janeiro, não perderia essa!

6 comentários:

Luis Alfredo Moutinho da Costa disse...

Prezados,
Os verdadeiros botecos não se encontram nas listas do Moacyr e nem da Veja Rio. Aqueles sobreviventes onde ainda se toma cerveja en pé. Abaixo, os botequins VERDADEIROS do Leblon:
1) Boteco do Ivan (Embalo Bar) – Rua Dias Ferreira 113
2) Bar Colinda – Rua Dias Ferreira 420 b2
3) Boteco do Marreta (Bar Marisqueira do Leblon) – Rua Dias Ferreira 420e
4) Boteco do Washington (Novo Rio Lanches) – Av. Bartolomeu Mitre 637a
5) (Boteco do ?) Bigorrilho Lanches – Av. Ataulfo de Paiva 814a
6) (Boteco do ?) Bar Urquiza - Av. Ataulfo de Paiva 814b
7) (Boteco do ?) Lanches Novo Leblon – Av. Ataulfo de Paiva 1237a
8) (Boteco do Oscar) Escondidinho do Leblon – Av. Ataulfo de Paiva 1335a
9) (Boteco do Roque) Figueira da Foz – Rua Humberto de Campos 827/Loja L. Ocupava o local hoje do Bar-Restaurante Chico e Adelaide, da esquina da Bartolomeu com a Dias Ferreira.
10) (Boteco do?) Brotinho Lanches – Rua Humberto de Campos 827/Loja ?
11 e 12) Bar Simpatia e Café Bar Ponto Xis – Rua Cupertino Durão 96a e 96b
13) Boteco do Oscar (Bar do Pedro) – Av. Afrânio de Mello Franco 209b

Fel Mendes disse...

Taí! Belo e útil comentário!

Luis Alfredo Moutinho da Costa disse...

Fel Mendes
tintin
precioso o texto citado.

Luis Alfredo Moutinho da Costa disse...

Fel Mendes,
Eis as características da ESPÉCIE EM EXTINÇÃO:
O boteco é o bar de rua, da cerveja em pé, tendo a calçada como sua extensão natural. Também chamados de butecos, botequins, butiquins e pé-sujo, apenas 15 ainda sobrevivem aquí no Leblon guardando as características da raça, quais sejam: cerveja tomada em pé (não há chope); mesinhas, sempre sem toalhas, são raras. Em alguns elas podem surgir durante o almoço para os PF´s, e retiradas logo após, quando permanece o indefectível tamborete ("meia-bunda"); jantar, nem pensar; preços módicos e fregueses que vão de celebridades (raras) ao gari e peão da obra. Cafezinho, só o daquela máquina inox que também esquenta o leite para a média matutina com pão e manteiga (não há pão na chapa); aquele copo gomado (copo americano da Nadir Figueiredo) abriga tanto o café e a média, como também os destilados e a cerveja; os seguintes etanóis são omnipresentes: cachaças 51, Velho Barreiro e Caninha da Roça, Conhaque de Alcatrão de São João da Barra, Jurubeba, Cinzano e Conhaque Dreher; alguns botecos acrescentam os Uísques Teacher ou Old Eight, os Conhaque Domecq, Steinhager Becosa, Vodka Smirnoff e alguns outros; o ambiente democrático aceita qualquer credo, cor, raça, e gênero, porém mulheres são raras; a famosa empadinha é raríssima, mas os pastéis podem surgir com intermitência; Cartão de Crédito? O que é isso? Em resumo,
BOTECO É BOTECO! O resto é bar ou restaurante.

Fel Mendes disse...

Amigos do Vermute com Amendoim:
Eis aqui uma declaração de amor verdadeiro ao botequim. A prosificação do verso do Moa: "Eu não resisto aos botequins mais vagabundos".

Luis Alfredo Moutinho da Costa disse...

Caro Fel, ...e Salve a baixa gastronomia! É "cosa nostra". Abaixo os chefs pintores de prato. Não esperem que a Veja, Água na Boca, etc. incluindo o tal do concurso "comida di buteco", valorizem o boteco de verdade. Vamos fundar a LINBO (Liga Nacional dos Botecos Originais).

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